11 de jun. de 2012

Vontade de alma


Nunca há a certeza, mas a alma é um gozo enorme. Você nasce, pisca, cresce, ama, dilacera, sofre... Há gozo maior que tudo isso? Ainda sente a ternura que é viver o pôr-do-sol, a lua cheia, a brisa, o mar batendo sorrateiro suas ondas de espuma... Você escuta o arder do fogo, o suspiro do vento, o arranhar das entranhas, e ainda quer mais. Então eu lhe digo: tem flor que brota no asfalto e não se vê; para o amor humano há o silêncio universal, há o silêncio dos astros, os espaços de longitude e latitude onde nenhum tratado de tordesilhas dividiria, onde nenhum estrangeiro qualquer ousaria vestir a indumentária da superioridade. A natureza goza continuamente o que escondemos, o que nos envergonhamos, o que relutamos e movemos para as sombras do ínfimo. Mas a natureza goza, e isso é o que importa. Ela goza partilhas, serenos de madrugada, luzes de velas, orvalhos... ela goza tudo o que perdemos de vista. Não há amorosidade maior que a das montanhas perdidas nos horizontes de além-mar. E toda aquela explosão de chuva amarela, azul, laranja, sedenta de esperança verde, de futuro em broto, que é a madrugada. Sonhar cada amanhecer como sendo o único, cada florescer como o mais colorido, cada som como uma rajada de acordes celestiais, mais o gosto da água transcendente. Nunca há a certeza, mas a alma está tão próxima do abismo quanto a filosofia das coisas do mundo, aquela filosofia que se resume no gozo perpétuo, no parto das imensidões, na flor do fruto. Eu quero mais do dia do que posso sentir, eu quero mais alma do que posso ser, mais efemeridade nos meus quintais, porque vida não se resume a versos ou canções. Eu quero ser mais abismo que sonhos, mais madrugada que raios, mais explosões que anseios. Porque a alma, inevitavelmente, é um gozo enorme. E somos todos a prole desse gozo.
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Viajante espacial da poética atemporal.

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